MIGUEL*
* A identidade do adolescente foi resguardada
O preconceito que expulsa
Por Caroline Rocha
entado nos bancos, próximo ao grupo com o qual conversamos, ele observa nossa singela movimentação enquanto almoça. De cropped e rasteira, é só sorrisos, alguns envergonhados, alguns genuínos de achar graça. Morador da Praça do Ferreira há aproximadamente um mês, Miguel, como iremos chamá-lo aqui, de 13 anos, já parece estar adaptado àquela realidade. Conversa e brinca com os outros moradores sem embaraço e quando algum passante se aproxima, aborda e pede por moedas. “Ei, mulher, me dá uma moedinha?”. A resposta, na maioria das vezes, é o silêncio ou uma desculpa.
Pelo contato que tivemos com Miguel durante nossas visitas à praça, percebemos que ele se tornou mais expansivo durante as semanas que passou ali, o que se reflete em sua decisão de falar conosco. Antes, não queria conversar. Dessa vez, veio puxar assunto conosco e concordou em narrar sua história, que, apesar de ainda curta, é repleta de percalços.
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"Aqui posso ser o que eu quero, lá na minha casa não posso."
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“Saí de casa porque minha mãe tem preconceito. Ela me botou para fora”, começa a nos contar, portando um semblante completamente diferente da descontração que exibia minutos antes, como se tentasse transparecer indiferença à essa parte da própria história. A razão do preconceito da mãe pode ser vista cobrindo o corpo de Miguel: ele é um menino que usa roupas “de menina”.
A praça foi o lugar que o acolheu após a expulsão. “Eu tenho um amigo aqui, que eu já fiquei em abrigo com ele. Aí de casa eu vim direto pra cá”, conta. Para Miguel, morar na praça é “mais ou menos”. Falta comida e o mínimo de conforto e sobra a vulnerabilidade e a desproteção de não estar entre 4 paredes. Entretanto, apesar das dificuldades, é lá que ele pode ser quem é, coisa que não podia em casa. “Aqui eu nunca sofri preconceito. Nunca aconteceu”.
Miguel pretende sair da praça em breve. Ele sonha em se tornar médico, mas largou a escola desde que foi expulso de casa. Perguntamos se ele tem intenção de voltar a estudar e a resposta é sim, mas Miguel não sabe quando isso vai acontecer. Frequentar a escola lhe parece uma realidade distante agora que é preciso se preocupar se vai ter ou não o que comer no almoço.
S
*Fonte: Secretaria Municipal de Trabalho, Desenvolvimento Social e Combate à Fome (Setra)